O paradoxo da tolerância

Um tolerante intolerante.

Ocupemo-nos a seguir da tolerância.
Esta consiste em admitir todas as doutrinas e na recusa de qualquer fundamentalismo ideológico.
Por vezes, quando se fala em tolerância alude-se à liberdade religiosa. Lembremos, por exemplo, as célebres Cartas sobre a Tolerância de Locke em que se discute fundamentalmente a liberdade dos vários cultos (excluídos, desde logo, o católico e o islâmico).
Em todo o caso, a tolerância, tomada na sua mais estrita acepção, embora abranja a liberdade religiosa, ultrapassa-a patentemente.
Conforme dissemos, a tolerância envolve não só as concepções religiosas mas todas as concepções em geral – filosóficas, políticas, etc.
Ora se devem tolerar todas as concepções também se deve tolerar a intolerância com o que, consoante nota Marcuse, a tolerância se destrói a si mesma.
Para obviar a isso só há um processo: não tolerar qualquer espécie de intolerância. Em semelhante circunstância a tolerância transforma-se numa ideia oficial, num credo que tem de ser acatado por todos. Eis que a tolerância se torna intolerância. O paradoxo é patente porque das malhas desta tenaz não há que escapar.

António José de Brito in «Alguns paradoxos das doutrinas sobre os direitos dos homens», 2002.

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