Procissão do Corpo de Deus na Lisboa quatrocentista.
|
A procissão do Corpo de Deus faz-se há anos com uma pompa e solenidade, que excede tudo o que se pratica nos outros lugares da Cristandade.
As ruas, por onde passa, estão juncadas de verdura e de flores, e guarnecidas de tropa. As casas estão cobertas de parte a parte na altura dos telhados de damasco e carmesim, forrado por cima de toldos de linho. De distância a distância vêem-se grandes lustres e magníficos altares de descanso.
Há neste dia no Terreiro do Paço e no Rossio uma colunata de madeira em arcada muito larga e muito elevada, em forma de algo de triunfo todo pintado, e ornado de belos painéis, por baixo do qual passa a procissão, como em todo o resto do trânsito, a coberto das injúrias do tempo. As casas estão armadas de seda; às janelas vêem-se as damas riquíssimamente enfeitadas e é defeso aos homens aparecer às janelas.
El-Rei assiste à cerimónia acompanhado de todos os grandes da Corte, e precedido de todas as confrarias, dos cavaleiros de Cristo, de Avis e de São Tiago, de todas as ordens eclesiásticas, e do Patriarca com seu clero, a que dão grande realce os principais mitrados.
A Rainha nesta ocasião vai para casa do Ministro, a qual está situada de maneira que Sua Majestade fica no centro da procissão; porque a descobre ao longe vindo da esquerda, donde se estende depois pela grande rua dos ourives do ouro, que está em frente das janelas que ela ocupa; e depois vê-se dar volta pela rua dos mercadores, que lhe fica à direita. Esta procissão mete tanto povo que há já uma boa parte de volta antes da outra ter acabado de desfilar neste sítio; de maneira que a Rainha, descobrindo a procissão toda de ponta a ponta a igual distância das janelas, que ocupa, vê-a assim em forma de cruz, formando um soberbo espectáculo.
Pierre Prault in «Description de la ville de Lisbonne», 1730.
Sem comentários:
Enviar um comentário