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Reparem, Senhores: o pensamento político de Salazar que se denuncia nas Festas centenárias que idealizou e promoveu, que raízes tem? De que sangue se alimenta? Em que doutrinas se funda? Numa palavra, – de onde emana, o Pensamento político de Salazar?
É, porventura, da ideologia que inspirou as disposições
da Constituição de 1911? É por acaso do Verbo dos agitadores da plebe da
geração de 90, e das gerações suas discípulas?
É, porventura, dos princípios fixados pela Tábua dos
Direitos do Homem, ou das doutrinas execráveis da Enciclopédia do século XVIII?
Quem foram os mestres desse Pensamento? Rousseau e Voltaire, Lamartine e Victor
Hugo? Mouzinho e Oliveira Martins? Guilherme Braga e Junqueiro? Todos nós
sabemos que esses doutrinadores são antitéticos da orientação de Salazar.
Leiam-se os discursos políticos deste; interpretem-se as
suas posições, não sob o ângulo da hora em que são ditas, mas à luz da crítica
filosófica, e, sem dificuldades, se verá que os seus Mestres foram Maurras e Le
Play, Jean Guiraud e Menendez y Pelayo, Leão XIII e Pio X, os Mestres da
contra-revolução portuguesa, e Alberto Sampaio. E se, algum dia, os seus olhos
se poisaram em rimas ou estrofes, para receber os eflúvios espirituais que
contêm foi – nas de Camões ou Bernardes, Sá de Miranda ou Correia de Oliveira,
António Nobre ou Eugénio de Castro, Guilherme de Faria ou Mário Beirão, – poetas
cristãos e genuinamente portugueses e não em certos pretensos modernistas,
deformadores ou falsificadores da Beleza pura e da Poesia em si.
Ora tudo isto traduz, não Revolução francesa – alma mater
do Liberalismo comunizante, mas Realeza tradicional de Portugal.
Veja-se a orgânica política do Estado Novo – obra de
Salazar: a Assembleia política, reduzida ao mínimo, no tempo, e nas funções;
quase só consultiva e esclarecedora, é a versão actual das nossas Côrtes
tradicionais; a Câmara corporativa é o reconhecimento legal dos grandes elementos
tradicionais da Nação – desde a Família à Província, desde as Corporações aos
ofícios; o predomínio da Autoridade, benéfico para todos, sobre a Liberdade,
prejudicial para todos; o predomínio do Bem comum sobre o Bem individual; o
conceito da Família primando sobre o conceito do Indivíduo; o Social preferido
ao Individual; o Bem de cada um consequência do Bem de todos, em vez do Bem de
todos consequência do Bem de cada um – tudo isto que é se não de origem
tradicional, obra da Realeza secular da nossa terra?
E se isto não bastasse, tínhamos no princípio da
reeleição presidencial sem limites, garantindo na Constituição em vigor, o
reconhecimento da grande virtude da Realeza, – como adopção da minha velha lei:
«a República é tanto mais perfeita quanto mais se aproximar da Monarquia, sem
nunca a atingir».
Qual tem sido o grande fundamento da obra de Salazar?
A continuidade no Poder.
Há perto de trinta anos que eu formulei, diante do
público, as condições essenciais de um governo fecundo: estabilidade,
continuidade e homogeneidade – características específicas da Realeza
hereditária.
Têm essas características sido o instrumento feliz da
política de Salazar. Estabilidade: – há mais de dez anos que governa o País;
Continuidade: – promete e realiza, porque a Estabilidade lho permite;
Homogeneidade: – com todas as suas falhas e desvios, os elencos ministeriais
têm-se, mais ou menos, adaptado ao pensamento director do Presidente do
Conselho.
A sua política, quer nas directrizes de técnica
constitucional, quer nos processos realistas da execução, é de pura inspiração
monárquica, e anda manifestamente distante do Estado de coisas que preparou o
regime de 5 de Outubro.
E Salazar, o homem profundamente nacionalista [patriota], católico como o Portugal de sete séculos; ele que proclamou D. Afonso I «fundador do nacionalismo [patriotismo]» português; Salazar, o espírito culto e reflectido que é, não podia sonhar para os tempos novos que idealiza, para o futuro português que prepara, outros alicerces morais que não fossem os do Catolicismo, e outros alicerces políticos que não fossem os da Realeza hereditária, matriz admirável em que se criou Portugal: ou sejam – o Trono e o Altar.
Portugal foi durante sete séculos um Estado hierarquizado,
vertebrado – imagem do Homem ou imagem de Deus: um pensamento a mandar; órgãos
a executar; e o corpo a obedecer.
Só assim o Rei D. Afonso I pôde fundar Portugal, e o Rei D.
João IV pôde restaurar a sua Independência.
Só assim Portugal pôde realizar a grande obra de seus descobrimentos e do seu Império.
Pulverizem a Autoridade de um só; invertam as funções, e
ponham o dirigente à mercê dos votos ou caprichos dos dirigidos – e nem
Portugal se teria fundado, nem Portugal se teria restaurado, nem o Império
português se criaria.
Como podia Salazar inspirar-se no Portugal acéfalo ou anárquico, invertebrado e catastrófico da Demência parlamentar e liberal que a Revolução de 1820 introduziu entre nós, e a de 5 de Outubro consagrou, se tudo nele é propósito realizador, dentro do mais estreme nacionalismo [patriotismo]?
Alfredo Pimenta in «A Fundação e a Restauração de Portugal», 1940.
§
Nota: Alfredo Pimenta caiu num certo intelectualismo ao dar a entender que Salazar apenas foi quem foi, porque leu determinados autores. Seria mais justo dizer que Salazar, apesar de ter lido certos autores, herdou um espírito, uma moral e uma mentalidade que era normal no Portugal rural daquela época.
8 comentários:
Grande síntese do pensamento salazariano peol Mestre Pimenta!
O desafio é reconstituir um regime que se adapte ao Portugal de Hoje, sem o Salazar que não existe.
Como fazê-lo, por onde começar e que Constituição teríamos?
Portugal de hoje? O Portugal de hoje é igual ao Portugal de ontem e de amanhã. A essência de Portugal é a mesma, não muda. Por isso não creio em soluções desse tipo.
Nos tempos que correm, uma restauração integral de Portugal é praticamente impossível. Só com um milagre (literalmente). Por isso, e perante a decadência geral, só nos resta tomar o partido da resistência. Resistir ao máximo. Permanecer de pé entre as ruínas.
Porque é que Salazar não restaurou a Monarquia?
Ass. João Miguel
Porque não havia condições políticas e humanas para essa restauração. Quando o próprio pretendente ao Trono não tem espírito e mentalidade monárquica, de pouco ou nada vale a restauração.
Bem me queria parecer que o mal já vinha de trás.
Um pretendente ao trono em defesa da Monarquia constitucional.
Ass. João Miguel
Antes o Estado Novo que uma monarquia democrática ou república coroada.
Nada mais correcto. Não pretendia com o meu comentário anterior defender um Rei constitucional. Defendo aquilo que já escrevi aquando do seu artigo sobre o mito do absolutismo.
Ass. João Miguel
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