Muito depressa chegará o teu fim neste mundo; vê, pois, como
te preparas: hoje está vivo o homem, e amanhã já não existe. Entretanto, logo
que se perdeu de vista, também se perderá da memória. Ó cegueira e dureza do
coração humano, que só cuida do presente, sem olhar para o futuro! De tal modo
te deves haver em todas as tuas obras e pensamentos, como se fosse já a hora da
morte. Se tivesses boa consciência não temerias muito a morte. Melhor fora
evitar o pecado que fugir da morte. Se não estás preparado hoje, como o estarás
amanhã? O dia de amanhã é incerto, e quem sabe se te será concedido?
Que nos aproveita vivermos muito tempo, quando tão pouco nos
emendamos? Oh! nem sempre traz emenda a longa vida, senão que aumenta, muitas
vezes, a culpa. Deus queira que tivéssemos, um dia sequer, vivido bem neste
mundo! Muitos contam os anos decorridos desde a sua conversão; frequentemente,
porém, é pouco o fruto da emenda. Se for tanto para temer o morrer, talvez seja
ainda mais perigoso o viver muito. Bem-aventurado aquele que medita sempre
sobre a hora da morte, e para ela se dispõe cada dia. Se já viste alguém
morrer, reflecte que também tu passarás pelo mesmo caminho.
Pela manhã, pensa que não chegarás à noite, e à noite não te
prometas o dia seguinte. Por isso anda sempre preparado e vive de tal modo que
te não encontre a morte desprevenido. Muitos morrem repentina e
inesperadamente; pois na hora em que menos se pensa, virá o Filho do Homem (Lc
12,40). Quando vier aquela hora derradeira, começarás a julgar muito
diferentemente toda a tua vida passada, e doer-te-á muito teres sido tão
negligente e remisso.
Quão feliz e prudente é aquele que procura ser em vida como
deseja que o ache a morte. Pois o que dará grande confiança de morte abençoada
é o perfeito desprezo do mundo, o desejo ardente do progresso na virtude, o
amor à disciplina, o rigor na penitência, a prontidão na obediência, a renúncia
de si mesmo e a paciência em sofrer, por amor de Cristo, qualquer adversidade.
Muito fácil é praticar o bem enquanto estás são; mas, quando estás enfermo, não
sei o que poderás. Poucos melhoram com a enfermidade; raros também se
santificam os que andam em muitas peregrinações.
Não confies em parentes e amigos, nem proteles para mais
tarde o negócio da tua salvação, porque mais depressa do que pensas te esquecerão
os homens. Melhor é providenciar agora e fazer algo de bem, do que esperar pelo
socorro dos outros. Se não cuidas de ti no presente, quem cuidará de ti no
futuro? Muito precioso é o tempo presente: agora são os dias da salvação, agora
é o tempo favorável (2 Cor 6,2). Mas, ai! Que melhor não aproveitas o meio pelo
qual podes merecer viver eternamente! Tempo virá de desejares, um dia, uma hora
sequer, para a tua emenda, e não sei se a alcançarás.
Olha, meu caro irmão, de quantos perigos te poderias livrar
e de quantos terrores fugir, se sempre andasses temeroso e desconfiado da
morte. Procura agora de tal modo viver, que na hora da morte te possas antes
alegrar que temer. Aprende agora a desprezar tudo, para então poderes voar
livremente para Cristo. Castiga agora o teu corpo pela penitência, para que
possas então ter legítima confiança.
Ó louco, que pensas viver muito tempo, quando não tens
seguro nem um só dia! Quantos têm sido logrados e, de improviso, arrancados ao
corpo! Quantas vezes ouviste contar: morreu este à espada; afogou-se aquele;
este outro, caindo do alto, quebrou a cabeça; um morreu comendo, outro expirou
jogando. Estes se terminaram pelo fogo, aqueles pelo ferro, uns pela peste,
outros pelas mãos dos ladrões, e de todos é o fim a morte, e, depressa, qual
sombra, acaba a vida do homem (Sl 143,4).
Quem se lembrará de ti depois da morte? E quem rogará por
ti? Faz já, irmão caríssimo, quanto puderes; pois não sabes, quando morrerás
nem o que te sucederá depois da morte. Enquanto tens tempo, ajunta riquezas
imortais. Só cuida da tua salvação, ocupa-te só nas coisas de Deus. Granjeia
agora amigos, venerando os santos de Deus e imitando as suas obras, para que,
ao saíres desta vida, te recebam nas eternas moradas (Lc 16,9).
Considera-te como hóspede e peregrino neste mundo, como se
nada tivesses com os negócios da Terra. Conserva livre o teu coração, e erguido
a Deus, porque não tens aqui morada permanente. Para lá dirige as tuas preces e
gemidos, cada dia, com lágrimas, a fim de que mereça a tua alma, depois da
morte, passar venturosamente ao Senhor.
Fr. Tomás de Kempis in «Imitação de Cristo».
1 comentário:
Parabéns. Texto muito apropriado ao tempo, e imagem muito bem conseguida. Só não me caiu o queixo porque, sei lá ...!
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