Cidadão – No idioma antigo, habitante de Cidade. No moderno, todos (à excepção dos Frades) habitam na Cidade, ainda que nunca a hajam visto. Para entender pois este Vocábulo com a devida precisão, é necessário distinguir e separar o Cidadão cidadão, do Cidadão vilão, e do Cidadão aldeão, etc.
Nas Repúblicas modernas todos os Cidadãos são iguais, ao menos de palavra; porque todos são Cidadãos. Porém pelo que toca à realidade, há duas classes de Cidadãos, tão distintas uma da outra como o Oriente do Poente; a saber: Cidadãos opressores e Cidadãos oprimidos: Cidadãos ladrões e Cidadãos roubados: Cidadãos verdugos e Cidadãos assassinados. Quanto se comprazem os primeiros com um tal nome e com os privilégios a ele anexos, outro tanto se horrorizam os segundos somente em ouvi-lo. Todo o homem de bem, pacífico e religioso, especialmente se tem dinheiro, trema desde os pés até à cabeça só em ouvir o nome Cidadão.
Ainda não temos podido penetrar, porque a democracia moderna tenha escolhido este igualitário Vocábulo com preferência a outros. Dizemos isto, porque para igualar qualquer palavra devia ser indiferente; e tão honorífico seria chamar aos habitantes de um país com o nome de cidadãos, como com o de brejeiros ou bandidos, contanto que fosse comum a todos. Por ventura preferir-se-ia aquele por ser mais decente. Porém bem considerada a coisa, é preciso confessar que o nome Cidadão parece assaz vil para manifestar toda a dignidade e grandeza de um Povo essencialmente Soberano. Porque, vamos com clareza, não lhe cairia melhor o de Majestade? Pelo menos assim lhe era devido na qualidade de Soberano verdadeiro. E então que entusiasmo tão exaltado não causaria em um malsim, um lacaio, ou um sans-culotte, o ver-se saudado com a expressão de sirva-se Vossa Majestade?! Pelo menos deste modo se união perfeitamente o decoro e a igualdade.
D. Frei Fortunato de São Boaventura in «Novo Vocabulário Filosófico-Democrático, indispensável para todos os que desejem entender a nova língua revolucionária», Nº 2, 1831.
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