Invenção do corpo de D. Lourenço, Arcebispo de Braga


Corria o ano de 1663, quando D. João de Áustria, filho bastardo de D. Filipe IV, Rei de Espanha, entrando em Portugal pela Província de Alentejo, conquistou a Cidade de Évora, Capital da mesma Província, e pôs em grande consternação a todo o Reino; então foi quando, sobre duzentos sessenta e seis anos de sepultura, se achou neste dia [4 de Junho], do ano sobredito, o corpo do Arcebispo de Braga Dom Lourenço, único do nome naquela Primacial, tão incorrupto e fresco, e com tanta perfeição e inteireza de todas as suas feições e partes, como se naquela hora acabara de morrer. Foi o Arcebispo Dom Lourenço grande Português, e um dos que mais trabalharam pela conservação e liberdade do Reino, quando os Castelhanos, em tempo do Mestre de Avis, depois Rei, com poderosas forças o pretenderam conquistar e oprimir; e como agora se achavam Castelhanos e Portugueses no empenho da mesma conquista e defesa, reputaram geralmente os Portugueses por singular demonstração do Céu a seu favor, o expor-lhe aos olhos, em uma tal ocorrência, o corpo incorrupto daquele herói, cuja vista os podia justamente animar à defesa da liberdade; e assim sucedeu com efeito: Porque não passaram cinco dias, que não fosse roto e inteiramente desbaratado, o Exército de Dom João de Áustria, e dentro em vinte, recuperada a Cidade de Évora, como diremos em outros dias.

Pe. Francisco de Santa Maria in «Ano Histórico, Diário Português: Notícia Abreviada de pessoas grandes e coisas notáveis de Portugal», 1744.

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