Salazar e o soneto de Plantin


António Ferro, no seu admirável livro de conversas com Salazar, confessa-nos que um dos poucos quadros que decoram as frias paredes do gabinete de trabalho do ditador, contém o texto do célebre e esquecido soneto de Plantin, Le bonheur de ce monde. Salazar preza tanto esse soneto, que o transpôs com a sua própria mão para o oferecer a António Ferro.

Avoir une maison commode, propre et belle,
Un jardin tapissé d'espaliers odorans,
Des fruits, d'excellent vin, peu de train, peu d'enfans,
Posseder seul sans bruit une femme fidèle,

N'avoir dettes, amour, ni procès, ni querelle,
Ni de partage à faire avecque ses parens,
Se contenter de peu, n'espérer rien des Grands,
Régler tous ses desseins sur un juste modèle,

Vivre avecque franchise et sans ambition,
S'adonner sans scrupule à la dévotion,
Dompter ses passions, les rendre obéissantes,

Conserver l'esprit libre, et le jugement fort,
Dire son chapelet en cultivant ses entes,
C'est attendre chez soi bien doucement la mort.

Trata-se de uma imagem auto-reveladora comovente, este soneto em que são louvadas tantas felicidades simples, sonhadas, sem dúvida, por Salazar, mas proibidas para si próprio pela sua vontade indomável, monástica, de cumprir até ao fim o seu sacrifício.

Mircea Eliade in «Salazar e a Revolução em Portugal», 1942.

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