JOÃO TIAGO – Vejo, com certo espanto, que julgas perfeitamente legítimos governos, ou regimes, que não tenham a adesão da generalidade dos governados.
JORGE GUILHERME – Não percebo porque te admiras. Se a adesão dos governados na generalidade fosse o fundamento da legitimidade, toda a revolução tornaria ipso facto ilegítimo um regime. E até o regime que aceite tal fundamento, também, por seu turno, se tornaria ilegítimo se contra ele se erguessem alguns cidadãos. Seria o absurdo e o caos sem tirar nem pôr. O que já é pitoresco é que tão estranha doutrina também tenha sido defendida hoje em dia por cavalheiros que se proclamam monárquicos, isto é, adeptos de uma forma de governo em que a vontade dos governados não entra em nada para a designação dos governantes. A serem lógicos, o rei poderia ser deposto a cada instante, desde que a ele não aderissem os súbditos na sua generalidade. Claro que, então, a monarquia passaria a república e o rei a presidente. Enfim, sintomas de degenerescência intelectual que confrangem.
António José de Brito in «Diálogos de Doutrina Anti-Democrática», 1975.
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