Prisão de traidores conjurados contra D. João IV


Corria o primeiro ano da Aclamação d'El-Rei Dom João IV, de gloriosa memória, quando alguns Fidalgos Portugueses, impacientes na obediência do mesmo Rei, estimulados da ambição e da inveja, começaram a intentar e maquinar novidades. Foi o principal motor delas Dom Sebastião de Matos e Noronha, Arcebispo de Braga, por nascimento Português, mas Castelhano no génio. Havia recebido grandes mercês daquela Côrte, e aspirando a outras maiores, não duvidava sacrificar a liberdade da Pátria em serviço das suas pretensões. Buscou a Dom Luís de Meneses, Marquês de Vila Real, Cavaleiro de nobilíssimo sangue, mas de talento muito inferior. Facilmente se despenha da eminência o penhasco já abalado. Andava o Marquês descontente do estado das coisas, e sem réplica, se rendeu às razões do Arcebispo, bem pintadas da sua eloquência, de que era grande artífice. Logo o Marquês reduziu ao mesmo sentimento seu filho Dom Miguel de Noronha, Duque de Caminha; posto que mais o persuadiu, ou arrastou a este, o respeito de seu pai do que outra alguma razão, antes, se afirma, que propusera muitas em contrário. Pelo mesmo modo levou o Arcebispo após si a seu sobrinho Rui de Matos de Noronha, mancebo tão falto de experiências, como cheio agora, ou assoprado, de altas esperanças. Acresceu Dom Agostinho Manuel, Fidalgo ilustre e não menos erudito, que discreto, mas pobre, a quem a falta de bens atraiu, ou constrangeu a buscar melhor fortuna por caminhos extraordinários. A outros Fidalgos se diz que passaram as persuasões do Arcebispo, e com elas a notícia da conjuração, culpa de que depois os absolveu a piedade, ou lhe dissimulou a justiça. A todos (com outros muitos de esfera inferior) mandou El-Rei prender neste dia [28 de Julho], ano de 1641, dispondo as prisões com tanto acerto, que todos quase na mesma hora foram levados a diversos lugares. Pasmou o Reino de que caísse nódoa tão feia em sujeitos tão Ilustres; E não menos admirou toda a Europa o valor e resolução de um Rei, que nos princípios do seu Reinado ainda vacilante, não duvidou proceder contra homens tão grandes, que por seu sangue e dependência, envolviam a maior parte da nobreza de Portugal.

Pe. Francisco de Santa Maria in «Ano Histórico, Diário Português: Notícia Abreviada de pessoas grandes e coisas notáveis de Portugal», 1744.

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