Um dos episódios mais estranhos nas operações europeias do KGB, durante o meu mandato, ocorreu em meados da década de 1970, em Portugal, não muito depois da queda da ditadura salazarista. O Partido Comunista Português era o terceiro maior na Europa (a seguir aos de Itália e de França), e, em meados da década de 1970, o socialismo e o comunismo gozavam de amplo apoio em Portugal. Na verdade, nós tínhamos agentes infiltrados no serviço português de inteligência, e, no caos que se seguiu à revolução socialista que derrubou o salazarismo, os nossos agentes deram um golpe ousado. Uma noite, com a ajuda de infiltrados e simpatizantes dentro do aparelho de segurança, portugueses ao serviço do KGB conduziram um camião até à sede da PIDE e roubaram uma montanha de dados de informação confidencial, incluindo as listas de agentes da polícia secreta que trabalhavam para o regime salazarista. O camião, cheio de documentos, foi entregue na nossa embaixada em Lisboa e depois enviado de avião para Moscovo, onde os analistas passaram meses debruçados sobre os papéis. Portugal era membro da NATO e havia algum material de interesse limitado sobre as operações militares americanas na Europa. Mas o material realmente valioso foi a lista dos milhares de agentes e informadores que trabalharam para a ditadura salazarista. Mais tarde, os nossos oficiais usaram essas informações para coagir alguns desses agentes a trabalhar para o KGB. Na história dos golpes de espionagem da Guerra Fria, a operação portuguesa não foi uma conquista notável. Mas a audácia de fugir com um camião carregado de material directamente da sede da PIDE, não tinha exemplo. No início da década de 1990, viajei para Portugal, onde as autoridades portuguesas me trataram da forma mais cordial, levando-me a todo o país, entretendo-me abundantemente, incentivando-me a falar com diferentes grupos de pessoas. Fui entrevistado pelos principais meios de comunicação nacionais e não poupei nas palavras sobre o papel do Partido Comunista Português no apoio generoso às operações de espionagem soviética. Fui imediatamente denunciado por Álvaro Cunhal, líder do Partido, como mentiroso e traidor. Falando no dia seguinte em rede nacional, não respondi às acusações de Cunhal. Repeti o que já tinha dito várias vezes: "O Partido Comunista Português é o nosso melhor e mais leal aliado na Europa, e como cidadão e membro do Partido Comunista da ex-URSS, só lhes posso estar grato."
Oleg Kalugin in «Spymaster», 1994.
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