Os dois sistemas falharam inchando de exageros, de petições de princípio, de preconceitos camuflados, e – vendo bem de perto – de erros em muitos detalhes. E no entanto, encarados no seu conjunto, estes sistemas têm o efeito irresistível das mudanças de clima. Quando lanço um olhar aos dezoitos volumes das obras completas de Freud, nas prateleiras da minha biblioteca, lembro-me, por vezes, do aviso de Rembrandt aos visitantes do seu atelier, convidando-os a olhar para as suas telas de longe. – «Não metam o nariz nos meus quadros, o cheiro da pintura envenenar-vos-ia».
Poder-se-ia perguntar em que momento esse cheiro a pintura fresca se transformaria em veneno – em que momento Marx se torna "marxista" e Freud "freudiano". Seria satisfatório desculpar o mestre e atribuir todas as culpas aos alunos. Marx não teria provavelmente aprovado os métodos de Estaline e Freud ter-se-ia dificilmente responsabilizado pelos pesadelos iluminados de uma Mélanie Klein. Mas as sementes de tudo isto estavam já presentes no próprio mestre, na sua tendência fatal de saltar do pressentimento e da hipótese para a asserção dogmática, de brincar com os símbolos como um malabarista, de propagar uma mitologia pessoal na qual mistura o Museu Grévin e o Panteão Grego.
Arthur Koestler in prefácio a «La Scolastique Freudienne» de Pierre Debray-Ritzen, 1972.
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